quinta-feira, 8 de abril de 2010

Contos Artonianos #9

- Por Valkaria! Rápido com isso, Korn!
Arthur e Delrin usavam de força para atrasar as paredes que se fechavam sobre eles. Korn, atrapalhado com suas pinças e chaves-mestras, tentava desesperadamente abrir a fechadura da porta à sua frente e rezar para que ela abrisse para fora. Ferannia estava sobre o goblin, tentando decifrar a escrita em volta da porta, antes que a parede ocultasse as letras. O barulho de parede se arrastando criava um clima de urgência a todos e desespero. Eles sentiam que as coisas estavam por um fio. Mais um pouco e as desconfianças entre eles poderiam ser fatores decisivos em sua derrocada.
- É uma língua muito difícil, antiga. Mas os sinais eu reconheço como “afaste-se” e “perigo”. Tem alguns símbolos que são religiosos! – Ferannia virou o rosto imediatamente para Delrin clamando por sua ajuda com os olhos desesperados.
- Com mil demônios! Khalmyr me perdoe, mas que diabos de situação! Como poderei sair daqui para decifrar estes sinais e deixar o jovem Arthur sozinho?
- Delrin, eu consigo! Vá!
- Não seja tolo, Arthur! Nós dois não conseguimos mantê-las paradas, imagine você sozinho. Vamos acabar morrendo todos.
Korn movia suas peças de ladino na fechadura e sentia o suor escorrer abundante de sua testa. A discussão dos outros o deixaram mais nervoso ainda. Ele tinha esperanças de que os salvando daquilo, pudesse se gabar e fazer com que todos ficassem devendo a ele. Mas aquele pensamento já o abandonara faz tempo. Ele descobriu, então, uma armadilha. Uma agulha picou seu dedo e uma gota de sangue brotou.
- Fui envenenado! Eu vou morrer! Vamos todos morrer!
Ferannia olhou para Korn e abaixou-se para segurá-lo antes que ele tombasse. Uma lágrima começou a brotar e um olhar de resignação sem esperança mirava o pequeno goblin. Estava tudo perdido.
- Ferannia! Diga como se parecem os símbolos religiosos! Delrin poderá identificá-los se você descrever como são. – os gritos de Arthur pareciam uma luz de esperança para eles. Ferannia virou o rosto em direção à parede, segurando a lágrima.
- Os símbolos parecem língua anã, mas tem variações com estrelas de cinco pontas, alguns símbolos simétricos que se assemelham a um sol quadrado que tornam símbolos que parecem humanóides em seres menores. Tem um sol quadrado que diminui ao lado de símbolos humanóides que crescem. Não entendo nada sobre isso!
- Claro que não poderá entender, mas não tema. Eu já sei o que é.
Delrin soltou a parede, subitamente e correu em direção à porta. Arthur usou toda sua força para estacar seus pés no chão, mas conseguiu apenas dores nos ombros e nas costas. Ferannia puxou Korn e saiu da frente da investida do anão. Ele tocou na porta com as duas mãos espalmadas.
- Khalmyr me perdoe pela blasfêmia.
“A Mãe Noite não é compreendida. Ela oferece ao mundo frescor contra as chamas de Azgher, e abrigo contra sua luz cegante. Ela transforma os seres para que sejam capazes de viver nas trevas – assim, quando Azgher não brilhar mais, os povos de Arton poderão sobreviver.”
Era a crença dos devotos de Tenebra escrita em linguagem anã antiga, da época em que Tenebra era o maior culto dos anões de Doherimm. Delrin lembrou de seu irmão com pesar e abaixou a cabeça. As paredes pararam de se fechar, estavam quase se encostando aos ombros do largo anão. Arthur caiu sentado, bufando e suando litros. Ferannia esboçou um sorriso de agradecimento à Delrin. Korn, que até então estava com cara de doente, ergueu-se do colo da elfa e deu tapinhas animados no ombro de Delrin como se nada tivesse acontecido com ele.
- Sempre acreditei em você, amigão. Sua habilidade com línguas religiosas até me curou.
Delrin, entretanto, não respondeu.
- Você deveria ser mais corajoso, Korn. Você estava com tanto medo que preferia morrer envenenado a ser esmagado. Da próxima vez os símbolos podem ser indecifráveis para Delrin ou Ferannia e nós vamos realmente morrer.
Arthur falou severamente com Korn, atento aos perigos daquela situação. Confortou Ferannia com um sorriso correspondido e foi até Delrin que ainda estava com a cabeça baixa.
- Delrin, você fez o que pôde para nos salvar. Era preferível falar essa ladainha a morrer. Não perca seu ânimo.
- Existem certas coisas que não espero que vocês humanos em suas curtas vidas possam entender de nós, anões. Obrigado pelas palavras. Meu machado está sedento de sangue de criminosos. Vamos continuar.
Korn girou a maçaneta que já não possuía a agulha envenenada, uma vez já ativada. Eles estavam agora diante de uma sala retangular. A luz do arco de Ferannia iluminava pouco os cantos, mas dava para ver a estatua da deusa das trevas em sua forma sensual como se dançasse de frente a eles. Ao lado dela havia um portal que seguia com escadas para baixo. Eles se entreolharam, cansados.
Subitamente, ouviram barulho de correria vindo das escadas. Arthur segurou firme o cabo de sua espada e as tiras de couro que prendiam o escudo no outro braço. Delrin fazia questão de segurar seu machado anão com as duas mãos, franzindo a testa. Ferannia sacou uma flecha e preparou para atacar. Como era uma arma de tiro, pretendia disparar primeiro, antes que houvesse o contato corpo-a-corpo de seus aliados e inimigos. Korn ficou atrás deles, no meio da porta recém aberta com muito sacrifício. Ele pensou ali mesmo em deixa-los para trás, trancar a porta e fugir. Nenhum inimigo que houvesse sobrevivido tinha visto seu rosto. Ninguém iria atrás dele. Ele poderia voltar à favela e viver como sempre viveu.
Os passos de correria cessaram. Agora, eram passos de quem andava. As sombras causadas pela luz do arco élfico revelaram uma silhueta de alguém muito grande, mais de dois metros de altura. Ombros largos, cabelos espetados. Revelando-se à Arthur e Ferannia (já que Delrin e Korn enxergavam no escuro, já haviam visto o rosto de quem chegava), era um meio-orc com um sorriso sádico no rosto.
- Quem de vocês é o mais forte? O anão ou o humano?
Gazat sentiu que ainda controlava certos aspectos de sua vontade. Sua besta inferior mantinha os instintos selvagens e sanguinários. Seus olhos amarelados fitavam cada um dos quatro intrusos. Via um goblin, obviamente fraco. Uma elfa com um arco brilhante que exalava fraqueza. Porém havia o humano que era tão jovem que não possuía pêlos no rosto e o anão que parecia ser muito velho. Ambos portavam armas de respeito, isso o confundia.
Delrin e Arthur se entreolharam. Outros quatros humanóides encapuzados adentraram a sala. Provavelmente eram lobisomens idênticos aos que Delrin e Korn enfrentaram no bairro dos anões, há algumas horas.
- Na dúvida, vou matar os dois. Ao resto, não se intrometam na minha luta.
Gazat sacou seu enorme machado das costas. As duas lâminas estavam manchadas de sangue enegrecido. Ele correu em direção aos dois aventureiros. Ferannia parecia paralisada de medo. Korn chegou a tocar a maçaneta da porta. Um impulso a mais e ele trairia a todos e fugiria.
Arthur e Delrin brandiram suas espadas e gritaram como guerreiros. As lâminas do machado de Delrin e da espada de Arthur cruzaram com um dos lados do grande machado de Gazat. Dois cultistas já saltaram pelos flancos do anão e do guerreiro e cercaram Ferannia. Um deles agarrou-lhe o braço arranhando sua pele. Eles puxaram a elfa dali abrindo espaço para os outros dois avançarem sobre Korn. O goblin desviou da tentativa de agarrar de um dos cultistas, então o outro desferiu uma estocada com a espada curta, arrancando um filete de sangue em seu pequeno e esquelético braço.
- Delrin, cuide dos cultistas. Eu cuidarei do meio-orc!
Arthur deu um passo a frente, forçando Gazat dar um passo atrás. Delrin viu-se livre e voltou seu machado com toda força sobre o cultista que agarrara o braço de Ferannia. O golpe fora bem dado e cortou a mão da criatura, revelando o braço peludo de lobisomem. O clérigo de Khalmyr ainda defendeu-se com sua poderosa armadura de uma estocada do outro adversário. Ferannia se afastou tateando a parede até esbarrar com a outra parede, ficando num canto extremo. Korn se afastou mais ainda, recuando até o corredor e pegando sua adaga. Arremessou ainda gemendo de dor e nervosismo. Acertou a coxa direita de seu agressor. O outro avançou sobre ele tentando fura-lo, mas sem sucesso. O goblin era bastante ágil e magro, o que dificultava quem o acertasse.
Gazat sorriu para Arthur e o jovem guerreiro pôde sentir o hálito horrível do meio-orc. Com seu machado, ele golpeou novamente e, novamente, Arthur defendeu-se usando o escudo e a espada como bloqueadores. Apesar da defesa, Arthur sentiu uma enorme pressão para baixo e seus joelhos ameaçaram fraquejar. Era o peso da armadura somado ao peso do machado e da força do meio-orc que era muito forte.
Entre rangido de dentes e grunhidos de força, Arthur moveu-se para o lado oposto de Ferannia atraindo atenção a ele e arrumando mais espaço para lutar. Desferiu um golpe lento, mas com toda sua força. Gazat moveu-se para o lado, esquivando do golpe. Seu sorriso era cínico e enervava Arthur que tentava se concentrar, preocupado com os outros.
O lobisomem sem sua mão recorreu à garra da outra para tentar arranhar o anão. Porém, Delrin possuía suas defesas e desviou do golpe com sua armadura de talas de metal. Ferannia recuperou-se do choque inicial e atirou com seu arco nas costas do adversário de Delrin que estava prestes a perfurá-lo pelas costas. O anão virou o rosto para a elfa e a agradeceu rapidamente. Aproveitou e girou o corpo com seu machado fazendo um golpe de balanço, decapitando o lobisomem aleijado. Viu Korn em apuros e se aproximou dos dois cultistas que o molestavam.
Um lobisomem voltou-se para Delrin e conseguiu encontrar uma brecha na armadura pesada. Furou-lhe sem dó, arrancando uma gorda quantidade de sangue que pintou o chão sob o anão de vermelho. Ele urrou de dor, o que deixou Korn mais assustado ainda. Deixou Arthur mais preocupado. Deixou Ferannia chorosa. Korn pegou sua besta, afastando-se mais ainda e deu um tiro de virote, acertando aquele que já tinha sua coxa perfurada por sua adaga. Ele, entretanto, não desistiu de sua perseguição e caminhava sobre Korn.
Alheio ao que acontecia, Gazat desferiu um golpe percorrendo um arco na perfeita horizontal. A lâmina do machado deceparia o jovem Arthur, se ela não tivesse parado antes de terminar sua trajetória.
- Preste atenção no que está fazendo, humano. Ou você será uma presa fácil. E entediante.
Arthur não acreditou no que ouviu e desferiu mais golpes com sua espada, dessa vez causando um talho no flanco esquerdo de Gazat. O meio-orc sorriu, como quem se deliciava com a dor.
- Isso mesmo, isso mesmo.
O próximo golpe de Gazat foi devastador. Arthur usou seu braço esquerdo com o pequeno escudo para se defender, mas a madeira não foi suficientemente forte para agüentar o golpe. Partiu em mil pedaços, arremessando Arthur ao chão com o braço esquerdo dolorido.
A essa altura, Ferannia havia já acertado mais um tiro com sua flecha e matado um lobisomem. Delrin derrubou seu agressor e sentiu-se tonto pela perda de sangue. Korn desviou novamente de mais um golpe e, como não tinha espaço para se afastar, tirou a adaga da coxa do lobisomem e furou sua barriga. Um riacho de sangue quase o acertou. Korn olhava para seu próprio ferimento e percebeu que não era muito sério. Delrin, por outro lado, estava encostado na parede, recuperando fôlego e pensando em ajudar Arthur com seu difícil adversário.
- As coisas estão feias.
- Khalmyr não nos abandonará, nossa causa é justa. Khalmyr! Khalmyr!
Delrin reergue-se e correu na direção de Gazat, mas errou seu golpe. Arthur tentou aplicar mais um golpe poderoso, mas acertou o chão dessa vez. Gazat girou seu machado e acertou a parede. Por pouco não decepava um braço do jovem guerreiro. Ferannia mirou outra flecha em Gazat e cravou-lhe nas costas.
- Vocês não são de nada.
Gazat começou a rir com a picada que sentiu no ombro. Era Korn já preparando outro virote.
- Goblinzinho irritante.
Arthur aproveitou o momento e fez um talho profundo no peito de Gazat. Sangue escorreu farto.
- É o máximo que pode fazer, guerreiro?
Delrin orou para Khalmyr que curasse um pouco de seu ferimento e se manteve de pé mais um pouco, inibindo a tontura pela perda de sangue.
Gazat aproveitou o ensejo e bateu com violência no anão com o cabo do machado. Delrin voou longe, quase atravessando o salão inteiro. Arthur gritou para Korn cuidar de Delrin. Ele mesmo saltou sobre Gazat com muita raiva e cravou sua espada na barriga. O meio-orc era apenas sorrisos. Mas dessa vez, golfou sangue e dobrou os joelhos. Tombou provocando um grande barulho.
- Não morra agora, amigão. Precisamos de você. – Korn tentava manter Delrin de olhos abertos. Mas nesse momento, o clérigo de Khalmyr estava com a mente bem distante dali.

Um comentário:

Dudu disse...

Qual é meu personagem mesmo??

hueuhuhueuhehueuhe