quarta-feira, 29 de abril de 2009

Aurora Carmesim - Prólogos, parte 8


Ano 632

Reunidos, os três exultavam de seus progressos. Em alguns meses seu ataque havia praticamente dobrado o panteão. O caos estava se espalhando e separados como estavam, nunca poderiam lhes fazer frente.

Atacavam igrejas, templos e cultos com a inteligência de Tillian e a astúcia de Valkaria. E, além disso, os humanos eram uma excelente maça de manobra, pensava Kallyadranoch. Nasciam e cresciam rapidamente, eram extremamente adaptáveis e tinham um enorme potencial para o bem e para o mal. Viva a ambição.

Reunidos no maior templo da maior cidade de seu universo inventado, os três pensavam no próximo passo. O que viria agora? Quando poderiam efetuar o ataque final e abalar de uma vez as estruturas de poder?

Sabiam que seu segredo não durara muito tempo após o início dos ataques. O panteão sabia deste lugar, mesmo que sem poder e com problemas demais pra vir até aqui. Ao redor da mesa redonda, Tillian desfiava idéias e conjecturas sobre como atacar os deuses restantes. Ele já planejara incursões aos planos de meia dúzia de divindades e nunca perdera mais que algumas vidas. Valkaria fitava o horizonte distante, indagando-se o que mais teria que conquistar em sua escalada ao topo, seria desafiadoramente mortal. Kallyadranoch olhava os dois com uma expressão divertida. Poderia destruí-los aqui mesmo, nesse local, se fosse proveitoso em sua busca. O poder máximo. A liderança do panteão e o jugo sobre Arton.

Com interesse renovado, Tillian viu a expressão do deus dos dragões mudar quase que instantaneamente. Empertigou-se na cadeira ao notar o que se formava ali. Um misto de júbilo e apreensão. Algo lhe ocorrera e seu sorriso reptiliano rasgava-lhe a face nesse momento.

- Eles darão a cartada final. Nunca imaginei que Khalmyr fosse chegar a esse extremo. Parece que causamos mais danos do que imaginei. Sonhei com esse momento por eras, o momento em que ele faria o ritual. A chance de ter tudo, de conquistar tudo, de descobrir tudo, chegou.
-----------------------------------------------------------------

Não era um plano simples. Ou fácil. Ou até mesmo inteligível, para alguns. Mas seria feito. A maior mente que existia o havia concebido. E depois de todos os cálculos e discussões, ele tinha forma. Todos colaboraram com informações e impressões sobre os três envolvidos. O que os move, o que lhes importa, como pensam, o que desejam. Tudo era um emaranhado quase palpável de idéias e lembranças. E sua função havia sido juntar tudo e depois elaborar um contra-ataque.

Ter Tannna-Toh tramando contra qualquer coisa não era uma boa idéia. Nesse momento, trabalhando a plenos poderes, ela notara isso com a mesma certeza que alguns dos outros deuses presentes. “Isso é algo a se trabalhar” – escondeu a nota nos recantos de sua mente. Enfim, falou, sopesando cada palavra:

- Quase tudo se encaixa agora – mostrando um poliedro brilhante quase completo formado de todas as coisas ditas e pensadas no recinto, que flutuava a menos de alguns centímetros da superfície da mesa – menos como fazer o réptil sair da toca. Todos sabem que o que rege sua natureza é a busca incessante por poder. Ele já tem poder sobre uma dimensão, sobre outros deuses e sobre nós, mesmo que limitadamente. Arton está dançando, na ponta de suas garras, pronta pra ser abatida. O que mais ele poderia querer?

A discussão retornara acalorada. Todos conjecturavam ferozmente sobre as mais variadas idéias. Dois se mantinham num silêncio contrastante. A figura idosa fitou o cavaleiro armadurado. Sua expressão era mais que transparente, na interpretação do cavaleiro. “Diga a eles. Chega de segredos” esbravejava ela sem dizer uma única palavra.

Mesmo sem necessitar, Khalmyr respirou fundo. Era um gesto mortal que o agradava imensamente. Podia significar quase tudo, desde impaciência até empáfia. Mas no geral, sugeria a tomada de uma decisão difícil.

- Eu sei o que pode tentá-lo. A todos eles, na verdade. Conheço toda a verdade sobre cada um dos deuses e com eles não é diferente. Posso oferecer algo irrecusável a cada um de vocês da mesma maneira que negar-lhes seu aspecto mais forte. Não esperava recorrer a tal impropério, mas não posso permitir que mortais sejam assassinados em vão, que famílias percam tudo o que construíram durante toda uma vida, que Arton sofra pela ambição de rebeldes. Não há justiça nessa atitude.

Levantou-se quase que inconscientemente, todos os olhares o seguiam hipnotizados. Aqui era onipotente. Onisciente. Onipresente. Era seu plano, mesmo que o tribunal fosse um lugar neutro. Atravessou a distância entre sua ponta da mesa e a figura idosa. Fitou cada olhar enquanto caminhava e sua realidade pareceu congelar durante o trajeto.

- Eis aqui a ruína dos deuses – um livro esfarrapado materializou-se em sua mão. Abrindo-o no ponto exato, o poliedro se completou. A expressão de Tanna-Toh se iluminou com o poder daquele novo conhecimento.

Com tudo dito, confirmado e discutido. Havia o grande plano.
E Thyatis soube que não perderiam.

domingo, 26 de abril de 2009

Aurora Carmesim - Prólogos, parte 7


Ano 632
O continente de Lamnor, berço da civilização, florescera em seus 632 anos de habitação e colonização. O barbarismo das tribos humanóides fora praticamente exterminado, a não ser pela ameaça constante dos goblinóides e outros "monstros" menores. No fim, todos os “colonos” foram bem-sucedidos em semear a terra, com feitos e tecnologia, sangue e fogo.

A crescente onda de violência se estendia por todos os reinos até então constituídos. Não uma guerra aberta, um conflito armado percebido por todos. Assassínio, mortes estúpidas, templos lotados queimados com fiéis dentro, seqüestros, torturas. O clima de agressividade velada não combinava em nada com tudo que fora conquistado até agora. Uma guerra santa instaurara-se, antes mesmo de seu conceito ser pensado por alguém.
-----------------------------------------------------------------

De seu trono, no centro da sua recém-construída fortaleza, o senhor da guerra planejava sua jogada. Teria de esquecer o conflito eterno entre goblinóides e elfos, mesmo com a satisfação pessoal que ele trazia. Agora era diferente. Os atos em Arton não beneficiavam seu aspecto em nada. Nenhuma guerra aberta, nenhum conflito armado, nenhuma violência declarada. Apenas traições, mortes, assassinatos, crueldades e atrocidades.

- O maldito deve estar adorando isso, deve sentir sua merda de poder crescer a cada dia. E a ironia é pensar que eu forcei a mudança daquele filho de uma cadela em direção ao que ele representa hoje. Mesmo um deus menor, ele deve farejar a oportunidade como um chacal. A morte o alimenta.

Levantando-se ele se adianta até uma grande mesa de pedra no centro do aposento. Sobre ela, um mapa de Arton detalhado e completíssimo. Posicionados em diversas posições, figuras de tropas, de máquinas de guerra, de navios e cavalarias. Uma inspeção minuciosa revelaria os movimentos autônomos e a semelhança com suas contrapartes reais. Ao norte do vasto continente, outras figuras dominavam o mapa. Tribos, animais, hordas. A guerra tinha muitos devotos e as crias de Kallyadranoch testavam sua fé. Convocaria uma nova reunião divina, tinha um plano traçado e seria sangrento, sujo, violento e o mais importante, rápido. Mas antes precisava cuidar dos seus no norte de Arton, dos que estavam longe das “civilizações”. Convocaria o batalhão.

Com um pensamento uma figura impressionante materializou-se na frente da divindade. Maior, mais forte e por incrível que pareça, mais ameaçador que seu deus. Mardoc era seu nome e guerrear fora seu propósito desde que Arton era jovem. Fora implacável e irrefreável em sua vida tribal ganhando passaporte direto para o reino de Keenn após tombar. Aprendera o modo de batalhar dos civilizados adequando-o à sua brutalidade bárbara. Era hoje o melhor que havia no reino.

- Sim, meu deus. Às suas ordens. – reverbera a figura ameaçadora, dobrando um dos joelhos. Fora vencido por Keenn em pessoa no último torneio e seu respeito pelo deus crescera enormemente desde então.

- Seu povo está sendo massacrado Mardoc. As tribos estão sendo literalmente devoradas pelos dragões e não tenho tempo de forjar os heróis para contê-los. Três deuses filhos da puta declararam guerra a todos os outros e o terreno em que essa merda será decidida é Arton. Você e seus irmãos são o melhor que disponho aqui pra mandar contra os lagartos. Vou mandá-los de volta. Será difícil como o inferno, mas se conseguir destruí-los prometo que seu sangue fluirá pelo povo que eu escolherei como meu. Seus descendentes formarão a nação de Keenn.

- Será um prazer meu deus, voltar a Arton depois de tanto tempo. Não sei o tamanho da merda, mas garanto que enviarei todos os lagartos filhos da puta a Werra, pra sofrerem em suas mãos pelo resto da eternidade. E depois festejaremos como nunca, povoando Arton com o povo mais feroz que existiu.

Levantando-se, a fúria lampejava nos olhos do homem. Uma besta de guerra. Dura, cruel, implacável e irrefreável. O júbilo que antevinha seu retorno era jovem em seu peito, mas o sorriso já denunciava seu prazer. Havia 300 anos que não pisava em Arton. Era uma lenda entre os seus e isso era uma certeza. Mas retornar em tempos de dificuldade para massacrar tudo que ameaçava seu povo garantiria uma marca na história que duraria pra sempre. Destruiria tudo que se movesse em prol de seu povo e seu deus. O tal deus dos lagartos iria sangrar.

- Quais são suas ordens meu deus, antes de partir?

- Reúna o Batalhão do Martelo. A ordem é matar. Ataquem à vontade. Você é meu arauto e minha palavra. Cace e destrua.

Em Arton, sacerdotes reuniam 50 relíquias de heróis do passado no círculo sagrado. Nenhum tinha consciência do que trariam a Arton. Nenhum estava no controle. Todos eram Keenn.
-----------------------------------------------------------------

Quando se sentaram à mesa, 4 meses haviam se passado desde a última reunião. Pacientemente, Khalmyr ouviu relatos e mais relatos. Ataques por toda Arton, incursões aos planos dos outros deuses, morte e destruição. Sozinhos não conseguiram progressos significativos. Os seguidores dos três eram engenhosos em seus métodos, a cada dia mais poderosos e mais ambiciosos. Um de seus maiores feitos fora invadir o plano de Lena e matar milhares de criaturas, se aproveitando da indecisão da deusa. Antes que ela tomasse a decisão de intervir, eles se foram da mesma maneira que chegaram. Isso se repetiu nos planos de Marah, Tanna-Toh e Lin-Wu.
Os poderes dos três reunidos era grande demais, admitiu para si um Khalmyr abatido. Sua força estava em agir em conjunto, como um, enquanto o panteão se dispersava como abelhas, cada um cuidando de sua colméia. Desconfiava que apenas Keenn tivesse tido algum sucesso, dado o sorriso maléfico em seu rosto. O que quer que fosse decidido ali sabia que seria difícil de engolir, mas era necessário como ele mesmo havia dito a algum tempo atrás. Praticaria a humildade que pregava, era um líder e sabia quando recuar e ceder.

- Eu convoquei e como imaginam, venho a vocês com um plano. É temporário, já adianto, mas nos dará a chance de vencer de uma vez esses malditos. Uma jogada pelo prêmio todo. Uma única vez.

E contou seu plano, que veio a ser apenas um esboço do verdadeiro curso de ação. Todos opinaram, todos debateram, todos acrescentaram. Juntos.
Arton iria tremer, se salvar ou cair de uma vez.
Era guerra.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

Conto de fadas


Era uma vez um fazendeiro. Este fazendeiro vivia em seu pedaço de terra no reino de Pondsmânia. Ele era muito pobre e mal podia sustentar sua família que era composta de uma esposa e quatro filhos todos bem pequenos. Seu pedaço de terra era árido e pouco produzia. Vender sua produção na cidade era muito difícil para ele visto que seus legumes e verduras eram pequenos e mal formados.

Um dia quando estava na beirada da floresta que há próximo ao seu pequeno pedaço de terra rachando lenha, o fazendeiro avistou uma pequena criatura. Essa criatura não tinha mais que trinta centímetros, voava numa velocidade muito grande que seus olhos mal podiam acompanhar. A criatura era uma fada, mas o fazendeiro não sabia. A diminuta criatura pousou sobre uma pedra e olhou o fazendeiro com seus grandes olhinhos de inseto.

- Quem é você? – Perguntou o homem, que mal possui cinco dentes em sua boca.

- Eu sou Volk, e você humano, quem é? – Retrucou sem medo a pequena criatura.

- Sou Mizael. O que é você? - Quis saber o fazendeiro em sua ignorância.

- Sou um Sprite, ou fada, ou criatura feérica, como preferir. Sou filho de Wynna, a deusa da magia.

O homem ficou intrigado, olhando para o pequeno sprite (que agora ele sabia ser macho) como se visse um pequeno deus. Ele já havia ouvido lendas contadas por sua avó que algumas criaturas podiam realizar desejos, dizia sua avó que as fadas eram uma delas.

- Você realiza desejos? – O homem perguntou.

- Não, mas sou capaz de sortilégios mágicos. – Disse de maneira simples a fada.

- O que isso quer dizer? – O homem mal entendia o que o sprite falava, seu vocabulário era estranho para uma pessoa tão sem estudo.

- Quer dizer que posso fazer magia. Coisas aparecerem e desaparecerem, por exemplo. – Respondeu o sprite.

Após dizer isso a fada agitou seus dedinhos e uma espécie de brilho cobriu suas mãos, logo após toda a lenha estava rachada. O fazendeiro sorriu maravilhado como um simples gesto pudesse economizar o trabalho de um dia inteiro.

- Virei aqui todo dia lhe ajudar humano, e lhe mostrar as maravilhas dadas por Wynna, a deusa da magia. Aguarde-me aqui amanhã e em menos de uma semana haverá lenha suficiente para aquecer sua família por todo o inverno vindouro.

- Vou separar a lenha e trazer aqui amanhã então meu pequeno. Se você me ajudar todos os dias, poderei vender a lenha sobressalente na vila e assim ter um inverno mais gordo! Adeus pequenino!

- Adeus Mizael. Então até amanhã! – E com um aceno a fada simplesmente desapareceu diante dos olhos do maravilhado fazendeiro.

Assim foi durante as semanas do mês de Terraviva. O fazendeiro levava a lenha e o sprite chamado Volk a rachava. O fazendeiro vendia as sobras na vila e pôde comprar mais comida, mantimentos e até mesmo uma vaca para dar leite para sua família durante o inverno.
Certo dia após ter vendido toda a lenha que possuía, Mizael foi até a taverna e contou a todos a pequena maravilha que lhe acontecera. Todos ficaram curiosos e impressionados, mesmo lendas desse tipo sendo comuns no reino.

Dois dias depois, após atrelar sua charrete já vazia à cerca próxima de casa após mais um dia de venda de lenha, Mizael encontrou todos os seus filhos e sua esposa amordaçada e inconsciente na sua cozinha. Um homem aguardava por ele. Seu capuz cobria-lhe o rosto e Mizael que já não enxergava bem devido a idade já um pouco avançada, não pôde ver o rosto do assassino de sua família.

-Sente-se. – Disse o assassino.

- Quem é você. – Disse Mizael em meio às lágrimas.

- Sente-se ou será o próximo. – Ordenou o assassino.

- Quero saber exatamente qual é o trato que tem com a fada. Quero que me conte tudo que ela lhe disse ou mato ela também. – Disse apontando uma espada curta para a esposa dele.
E assim foi feito, durante toda noite o homem contou palavra por palavra o que a fada havia lhe dito. Os sortilégios que havia feito.

No dia seguinte, ao pousar na pedra que foi o ponto de encontro por todo outono, Volk descobriu que a pedra dessa vez guardava uma armadilha. Barras de metal encantado trancaram Volk em uma jaula. Nem mesmo suas magias mais fortes foram capazes de dar-lhe a liberdade. Mizael jazia morto aos pés de um homem de capuz que agora gargalhava de êxtase.

- Vamos Volk, clérigo de Wynna. Você será o próximo. – Disse o assassino em meio a risadas.

Volk orou para Wynna para que pelo menos pudesse despedir-se de seu filho que havia sido expulso de casa por sua intolerância.

O assassino olhou para dentro da jaula e riu sadicamente.

- Não é hora para preces Volk. – Disse e após entrou na floresta escura carregando a jaula consigo e desapareceu em meio à folhagem.

Aurora Carmesim - Prólogos, parte 6


Ano 632

Sentado em seu trono, ele sente. Uma dor tão alienígena que mal consegue processar no primeiro momento. Dobrando-se sobre o estômago ele cospe sangue divino no chão. Sete gotas. Impossível. O que estava acontecendo?
----------------------------------------------------------------
Correndo através do seu grande jardim, a árvore se aproxima. Uma infante, serelepe em seus passos, sorri para o mundo. Seu mundo. Fervilhante de vida em cada milímetro.
Estacando, ela arregala os olhos já mareados. Progressivamente a grande árvore começa a secar. Dos ramos mais frágeis aos galhos mais grossos. A vida estava morrendo.
-----------------------------------------------------------------

Um a um os deuses sentem o mesmo desequilíbrio, o mesmo incômodo. Seus filhos, seus devotos, estavam morrendo. A fonte primária de sua força, de seu extenso poder, estava se esvaindo sob seus narizes.
Em polvorosa, cada um age à sua maneira. Espionagem, lutas, resistência. Mortais matando mortais, por fé.
Quem seria o arquiteto por trás de tais atos? Quem tramara contra os deuses?
-----------------------------------------------------------------

Sob seu escrutínio, suas anotações revelavam algo muito maior do que um futuro negro para Arton. Havia sim algo mais movendo-se em silêncio, tramando contra o panteão.
Era hora sair da inércia. Um passo deveras arriscado, que poderia resultar na destruição mútua dos deuses. Porém, à luz dos novos fatos, não agir condenaria ela mesma e a todos os outros. Khalmyr precisava saber. Convocaria o conselho.
-----------------------------------------------------------------

Sentados à mesa, os dezesseis rostos fitavam o líder. As três ausências antes questionáveis agora estavam mais do que explicadas. Tudo o que fora dito, provado e mostrado por Tanna-Toh era estarrecedor demais. Tamanha ousadia não econtraria o perdão dos deuses. Se era uma guerra que os três desejavam, uma guerra teriam.

- Nesse momento irmãos, o estratagema fica límpido ante nossos olhos. Derrubar o panteão antes que agíssemos contra a cria dos três. Com o poder dessa nova criação, eles se fortaleceram o suficiente para ambicionar esta realidade e nos forçar a aceitar sua cria perversa. Agora, nossos filhos morrem em Arton. Nossos fiéis, nossos escolhidos, nossos devotos, todos perecem sob o ataque dos três. Trouxeram a guerra a nós sem aviso, sem justiça, sem possibilidade de reação. Caso a mãe da palavra não agisse, logo estaríamos por demais debilitados para tentar uma reação. É hora de reagir.

Um burburinho inrrompe entre os convivas. Como reagir? Como organizar uma reação a algo que teria sido tramado por centenas de anos? Como agir como um? Havia muito ego em jogo. O líder poderia sim convocar à guerra. Mas como atacar cada mortal, individualmente, de acordo com sua crença?

Era diferente de impedir que Kallyadranoch dominasse a realidade. De destruir suas crias, como fora feito milhões de anos antes. Era preciso um plano mais elaborado. Mas o tempo estava contra eles.
Pesando sua decisão, Khalmyr hesita. Pela primeira vez desde que assumira a liderança do Panteão, temia por sua escolha. Estava ciente dos riscos existentes. Revanche, retaliação, desonra, mesquinharia. Porém, achava que cada divindade estaria mais preocupada em salvaguardar seus próprios fiéis a atacar outras. Estava consumado.

- Não vejo outra alternativa irmãos. Tempos difíceis exigem medidas extremas. Concedo aqui um salvo-conduto a cada divindade presente, para que lute contra as forças dos três durante o tempo que for necessário. Cada um tem minha permissão para salvaguardar seus fiéis da maneira que achar necessário, utilizando dos meios que julgarem convenientes. Qualquer ato diferente desse propósito será sumariamente julgado e punido por mim, pessoalmente. Agora vão e ajam. Seu futuro depende apenas de seus esforços.

Em uníssono as dezessete cadeiras se afastam da mesa. Um por um os deuses desaparecem, retornando a seus planos de origem. Nada poderiam fazer diretamente contra a figura dos três, mas se Arton era o campo de batalha, cada um usaria de todos os meios possíveis para vencer.

Era guerra, pelo mundo.

quinta-feira, 2 de abril de 2009

E ae? Qual vai ser?

Galera to querendo saber como faremos nessa "pausa" da viagem de Renato? Quanto tempo vai ficar fora? Ficaremos sem jogos nesse tempo?

Enfim...


Outra coisa, não rola jogo no sabado pra mim... vou trabalhar de manha, infelizmente até as 13hs.

[]'s

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Aurora Carmesim - Prólogos, parte 5

Ano 391

A floresta estava rígida, num silêncio tenso. Do alto de uma colina íngrime ele observa, na forma de uma inocente criança. Estava tudo pronto. Todas as jogadas feitas e o próximo passo iminente. Iria começar e seria magistral. Seus poderosos ouvidos captam passos descompromissados se aproximando e ele se vira a tempo de encarar a face de seu mais novo "aliado". Mal sabe a criatura que é mais um joguete. Um cavalo na verdade, no grande xadrez dos deuses, mas ainda assim, sacrificável.

Ragnar adianta-se fitando a jovem criança. Cabelos negros desgrenhados, rosto pueril, braços definidos e roupa prática. Fora do contexto apenas o gládio e a machadinha que pendiam da cintura e costas, respectivamente. Era ele? Não sabia, mas sentia. Keenn.

- Olá Ragnar. Vejo que terminou seus preparativos e fico muito feliz. Vai ser memorável. Vão escrever sobre seu conflito durante anos e ficará marcado nos anais da história. Através de você terei uma guerra infinita. Através de mim você ficará conhecido além das fronteiras das matas. Adoro acordos lucrativos. Dê o sinal.

-----------------------------------------------------------------
Sentada em seu trono, a bela dama vislumbra um espelho feito de metal líquido. Refletindo apenas pontos e letras, um mapa de Arton. Maior e mais completo do que qualquer já elaborado por mãos mortais. Ela podia ver cada filho, em cada canto do mundo. Nomes, idades, profissões, tudo ali, à sua frente.

Desviando seu olhar do espelho ela fita a janela segundos antes do pouso de um pequeno falcão. Lindo e totalmente perfeito. Ele atravessa o salão em direção ao espelho e se apoleira sobre a moldura. Os olhos brilhantes encontram os da mulher e palavras rompem o silêncio tenso.

- Fale mãe da natureza o que a traz aos meus domínios, sem chamado?

- Vim dar-te um aviso, senhora dos elfos. Sua cidade vai ser atacada e seus filhos vão morrer. Um exército se reúne pra exterminar os seus. Avise-os e tenha uma chance, ignore-me e pereça.

- Como ousa insinuar que preciso de avisos e alarde contra o que quer que seja? Meus filhos vivem a mais tempo que qualquer outra raça pensante existente em Arton. Eles podem lidar e vencer o que quer seja lançado contra eles. O tempo nem ao menos pintou seus cabelos de branco ou enfraqueceu suas juntas. Nem ele pode contra nós. Agora saia mãe dos bichos, antes que seja posta daqui de volta à sua selva.

Com um farfalhar de asas, o falcão se desfaz em penas. Voltando à sua contemplação, Glórienn presta um pouco mais de atenção do ponto mais ao sul do continente.

- Vamos ver como eles se saem.

-----------------------------------------------------------------
A primeira onda chocou-se contra as muralhas invisíveis inadvertidamente. Fogo choveu do céu e ácido brotou das frestas sob os pés dos goblinóides. Cento e cinqüenta mil. Não havia sequer uma única tribo em Lamnor fora dos esforços de guerra. E mais nasciam a cada dia. Os elfos poderiam ser longevos, mas não eram eternos. E Ragnar sabia disso.

Suas tropas moviam-se numa paródia de organização e ainda assim era impressionante de se ver. Blocos de três, quatro mil goblinóides atacando a cidade. Duraria dias, meses, anos, mas eles conseguiriam atravessas as defesas. Os elfos não teriam uma única hora de descanso. Aquelas malditas crias de Glórienn seriam estraçalhadas sob suas garras. Ragnar espalharia morte por toda Lamnor. Animais, nativos, primitivos, nada escaparia à fúria de seu exército.

Haviam sim muitos em Lenórienn mas milhões esperavam em pontos-chave do continente. Assim que seu deus ordenasse, levariam o caos e a morte aonde ele desejasse.

E duraria séculos.

-----------------------------------------------------------------
Sentado em seu trono, Keenn sente os bons fluidos da guerra chegando a si. Era maravilhoso como aquela criatura ignóbil tinha se transformado tanto em apenas trezentos e poucos anos. Violência, crueldade e morte. Fora uma mudança positiva.

Sorrindo ele sente o choque de milhares, o terror de toda uma cidade ante a investida dos rotos e esfarrapados. Sente a morte pela espada, pelo arco, pelo fogo e pelo ácido. Sente a clava arrebetando uma cabeça e a lança empalando um fraco. Quase podia sentir o cheiro ferruginoso do campo. Tinha jogado bem, agora era esperar o próximo movimento.

-----------------------------------------------------------------
Ela soube no momento em que aconteceu. O choque de culturas, de forças e vontades. Sentiu a ameaça mas regozijou-se ante o novo conhecimento. Será que as crias de Ragnar sobrepujariam os filhos de Glórienn? Não importava, no fim.
Se aproveitando do momento em que, ela sabia, todos os olhos se voltavam ao primeiro grande conflito da história, ela pôs seu pequeno ardil em movimento.

Durante os séculos posteriores à visita a Thyatis ela povoou certos escolhidos com idéias e sonhos. Com conhecimento ainda impróprio, mas que floresceria no momento exato. Precisava resguardar sua descoberta, seu modelo. E sabia que o melhor lugar para escondê-lo era Arton. Bastava que desse as insruções corretas às pessoas exatas e tudo ficaria bem. Um monastério secreto, numa região erma com monges fanáticos. Uma ordem esquecida, com o único fim de proteger sua descoberta. Ter, mas não compreender. Guardar mas nunca utilizar.

Não lhe agradava a idéia de algo assim, mas era preciso a longo prazo. Nenhum deus poderia acusá-la de privilegiar-se de sua descoberta contra outros e nem requisitar sua ajuda. Seria uma criação mortal, no fim. Seus mortais escolhidos, mas ainda assim mortais.

Sorriu e com um gesto, enviou tudo às mentes predestinadas. Em dez anos o monastério seria instaurado. Em mais vinte, toda estrutura estaria pronta e daqui a sessenta anos, a próxima geração começaria a transrever suas descobertas pro papel. Levariam séculos para mapear uma simples década, mas era melhor assim. Conhecimento espalhado através das gerações.

O futuro era perigoso demais para que alguém o compreendesse por completo. Caminhando, ela deixa sua biblioteca com a cabeça já longe de suas últimas decisões esquecidas, povoada com invenções que ainda não existiam.