terça-feira, 14 de julho de 2009

Mais um post democrático


Olla omissos.

Resolvi antecipar esse post por razões puramente funcionais, a fim de conseguir alcançar todos em seus respectivos lares.

Como sabemos (pelo menos a maioria de nós), Aldenor se ausentará todo o restante do mês de julho para participar do encontro (anual da juventude comunista, cof, cof, desculpa) de história lá na puta que pariu. Isso normalmente invibializaria duas das três sessões que ocorreriam na minha folga e eu não quero que isso aconteça. Nada contra viagens de meio de ano e tempo de folga o qual todos (ou quase) têm direito depois de um tempo de labuta mas não faz parte dos meus planos pagar pela diversão alheia mofando no sofá da minha sala.

Eu gosto bastante de jogar RPG e esse é o meu hobby principal desde que me entendo por gente. Com isso, vim propor aos omissos renegados (que não podem/querem viajar) uma alternativa não-permanente para suprir as ausências nesses dois domingos vindouros. Seguem as perguntas/ sugestões:

- Como não sei quem efetivamente vai ficar em casa em julho, por favor comecem se manifestando;

- Tenho pronto um Spin-off de um cenário (semi-esquecido) de minha autoria, o Dança das Eras. Seriam uma ou duas aventuras de apresentação e familiarização com o cenário, para enventuais mudanças/ sedimentações;

- Poderia ocorrer uma sessão de storytellin', isso dependendo de quantos omissos permaneceriam em Niterói;

- Poderia ocorrer uma sessão de Aurora, dependendo também de quantos omissos ficariam em Niterói;

- Poderíamos iniciar algo com uma temática totalmente alternativa ao usual (tal qual Matrix, Cyberpunk, Call of Cthullu, Ravenloft, Eberron, etc) que duraria não mais de duas sessões, a priori;

- Poderíamos convidar um mestre externo (caso alguém conheça um) para uma experiência e eventual ingresso no grupo;

- Poderíamos não fazer nada por que apenas eu e Renato ficaríamos em casa e como o tempo não anda propício à praia, eu pelo menos cometeria suicídio (ou inventaria uma grande coisa, ou escreveria um grande livro, ou faria qualquer coisa que me tirasse do tédio, mesmo que não fosse saudável).

Bem senhores, é isso. Por favor expressem-se e opinem (com opiniões diferentes dessas acima, se existirem). Não postarei nada (e acho que ninguém mais deveria postar) até chegarmos numa decisão a contento.

Abraços e adièau.

segunda-feira, 13 de julho de 2009

Aurora Carmesim #1 - Travessia, parte 2


Um mundo verde, intocado, virgem. Thaedras não podia imaginar como as coisas tinham chegado até aquele ponto. Aquela era Lennórien, sua casa, seu lar. Como toda uma raça pôde deixar isso de lado?
Caminhava calmamente em direção ao acampamento goblinóide. A lua em foice era um rasgo avermelhado no céu, denunciando o sangue que seria derramado essa noite. O líder daquele acampamento devia morrer e ele estava ali para garantir isso. A resistência ganharia muito terreno depois de sua ação e o destacamento que cuidava daquela área fugiria feito um animal acossado.
O Leão aproximou-se da tenda que era seu alvo sem emitir quaisquer som maior que um sussurro. A noite estava perfeita para o assassínio e um certo júbilo correu por seu sangue quando ele se debruçou sobre o leito fétido de seu alvo. Gruundak dormia feito um bebê, incauto, alheio da ameaça que pairava sobre ele. O tempo ensinara Thaedras a manter sua intenção assassina contida até o último instante, até o momento do golpe da arma.
A lâmina deslizou de dentro de sua caverna espalhando um brilho lânguido pela tenda. Em um movimento suave ele a deslizou com um flash pelo pescoço de sua vítima, abrindo um talho rubro na garganta de Gruundak, no momento que ele abriu os olhos aflito. Nenhum som escapou de seus lábios apesar dos movimentos feitos por ele. O gorgolejar intenso quebrou a magia do momento e o Leão pisou em sua vítima, para impedir qualquer reação.
Em pouco tempo, o cadáver parou de se mexer e Thaedras deixou a tenda rumo à noite fresca da floresta.
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Xiucoahtl ouvia os relatos atentamente.
Numa torrente verborrágica seu vassalo desfiava informações, fatos e conjecturas. Ele bebia das palavras como um infante degusta o leite materno. Então esse era o plano, trazer a ruína dos dragões de volta à vida para acabar com Kallyadranoch. Mas o que fariam com o batalhão?
A pequena (tudo parecia pequeno face a Xiucoahtl) criatura findou seu relato num austo prolongado de ar.
- Obrigado Agnustaad. Como sempre você honra minha confiança. O que me trouxeste é deveras útil e recompensar-te-ei devidamente. Procure Hasmed-achinabul. Ela dar-te-há o que precisas. Agora vá e continue honrando-me, Agnustaad.
Debilmente a criatura correu em direção à parede mais próxima, interrompendo-se para uma última mesura exagerada antes de adentrá-la e sumir num brilho negro.
- Cledoveo, a mim! - urrou a figura titânica.
Num lampejo esverdeado uma figura baixa e compacta surgiu ante o dragão. Cabelos negros, túnica verde-capim, armadura forte e rija. Mãos poderosas fechavam em luvas desproporcionalmente grandes.
- Sim, mestre.
- Preciso que realize uma tarefa em meu nome, Cledoveo. A mancha rubra pretende manobrar contra nós trazendo um antigo mal a Arton. Eles querem aproveitar-se do momento de mortalidade de Kallyadranoch para dar-lhe um fim. E isso conflita diretamente com meus planos momentâneos.
Caminhando lentamente, Xiucoahtl atravessa a sala em direção a um pedestal na face sul. Enquanto movimenta-se ele lentamente se transmuta em uma figura pequena, ágil, furtiva. Logo a distância até o tabuleiro é coberta por um halfling de olhos muito vivos e careca brilhante. Pequenas bolsas assomam-se sob suas pálpebras, denunciando a idade já ultrapassando os trinta invernos. Roupas leves e confortáveis de viajante brincam sobre seus gestos controlados.
Olhando o tabuleiro ele recomeça:
- Um novo elemento adentrou o jogo Cledoveo - diz apontando um peão rubro -, novos poderes surgiram em Arton. Um pequeno grupelho, é verdade, que se devidamente conduzido pode nos auxiliar enormemente.
Movendo a peça por uma casa ele volta a fitar o tabuleiro, absorvendo sua nova configuração.
- Diga que desejo lhes falar. Um encontro amigável. Tentarei trazê-los para sob minhas bençãos sutilmente enquanto eles prestam-me favores sem perceber. Dar e receber, até que estejam sob meu jugo. Sei que não fui o único a notá-los mas desejo ser o primeiro a alcançá-los. Traga-os a mim Cledoveo. Logo.
- Sim mestre, já antecipo um meio de fazê-lo. Em dois dias eles estarão em sua presença. Retiro-me milorde.
- Vá com minhas bençãos.
E ele some em meio a um brilho suave, deixando Xiucoahtl imerso em conjecturas e projeções.
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- Olá Thaedras. Não é necessária tamanha precaução pois vim em paz. Vim trazer-lhe um recado de meu mestre. Ele deseja vê-los a todos em breve, em sua morada. Tome.
A tensão permanece quando Cledoveo entrega uma pedra seccionada no diâmetro a Thaedras, indo-se sem olhar pra trás.
Sob o olhar furtivo de Lena Thaedras examina a pedra e sopesa o momento.
Eles tinham que saber. Tinham que investigar.

Extinção #2 - Anjo profano


V Dlourá - Josefov - Old Downtown
Michael ofegava.
O peso da criança no seu colo, a adrenalina da fuga desenfreada, o frio cortante, tudo arremessava seu pensamento cada vez mais longe de si. Quanto mais progredia subindo a rua mais sua cabeça teimava em permanecer lá atrás, naquele cruzamento escuro. Via claramente a figura débil do homem que lhe salavara a vida estirado no chão, ouvia os passos das coisas rondando a caminhonete, sentia o cheiro do seu hálito podre, das roupas ocres, fedendo a sangue. A pequena criança permanecia imóvel feito um fardo no seu colo. Fria, seca, catatônica. Por causa dela capotaram daquela maneira. Por causa dela ele fugira, deixando à morte o homem que o ajudara sem mesmo saber seu nome. Por causa dela sentia um arrepio na nuca, uma sensação de urgência, um aperto na alma que denunciava que nenhum dos dois iria vislumbrar o amanhecer do dia de Natal.
Olhou o relógio mais por hábito do que por se importar com o tempo que passara correndo. Três e trinta da manhã. A rua revelava indícios de ser um centro comercial, daqueles com prédios de escritórios importantes e consultórios médicos caros. Precisava de abrigo. Precisava se aquecer, pensar.
Procurava uma brecha em todas aquelas fachadas de vidro, todas aquelas portarias cercadas por grades fortes, de metal. Continuou subindo a rua, agora em passos mais lentos. Dobrou uma esquina e mais outra, andando a esmo. Procurando. Pedindo aos céus por uma chance de viver um pouco mais. E a recebeu.
Uma portaria de vidro, no térreo de um prédio bonito, brilhando verde. Olhou para os lados - vendo no fim da rua um clarão de incêndio que bloqueava a avenida - procurando vestígios das coisas. Nada. Caminhou em direção às portas de vidro, deixou a pequena criança de pé ali com o olhar vidrado no infinito, e chutou a porta de vidro com toda sua força. Nada aconteceu. Outra vez e outra vez e ainda assim, nada.
Aflito, vasculhou a rua em busca de algo pra estilhaçar a porta. Nada, a não ser os parquímetros eletrônicos perfilados na lateral da via. Se fossem iguais aos de Paris ele teria uma chance. Agarrou um e destravou a base, liberando a grande caixa amarela do seu suporte. Usou-a como um tijolo, arremessando uma, duas, três vezes na porta até produzir algum resultado. A porta trincou-se por completo, porém, continuava de pé. Rasgou com as próprias mãos uma brecha e atravessou com a criança.
Dentro do hall, a luz de emergência inundava o ambiente com uma luz estéril, opaca, cinza. Um grande balcão, quatro elevadores, um relógio redondo na parede. Três e cinqüenta e cinco. Precisava descansar. Precisava se esconder. Precisava viver.
Perscrutou o salão e viu a saída de emergência. A escadaria o levaria para cima pelas entranhas do prédio e poderia, com algum esforço, ser trancada por dentro. Segurança, enfim. Michael levou a garotinha pela mão até o interior do corredor das escadas e entrou junto, escorando a saída com um dos batentes que delimitavam os acessos aos elevadores. Sentiu-se desabar parede abaixo, no escuro. Sua cabeça doía e ardia, provavelmente num corte do acidente. Sua mão latejava e seu peito estava em brasas. Aninhou a pequena em seus braços e entregou-se finalmente ao abraço de Morfeu.
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O mundo era branco mas as pegadas seguiam rubras. Estava correndo na neve, seguindo os rastros em direção a um pequeno bosque cinza. O céu era perolado, pontilhado de diamantes negros sobre sua cabeça. Sentia o frio nos ossos, o peito subindo e descendo rápido, o suor nas têmporas. Virou a esquina e entrou na cobertura das árvores. À sua frente, seis figuras se encaravam. Três de costas para ele, semi-curvadas, ronronando baixo mas ameaçadoramente. As outras três eram facilmente identificáveis naquele ambiente alvo.
Ele mesmo. Andriy e Bogdan.
Seus rostos exprimiam o pavor que sentiam numa careta bizarra, eram figuras muito coloridas naquele mundo cintilante. Uma fração de segundo depois as coisas atacaram, cobrindo os poucos metros que os separavam agilmente. Michael se pegou olhando atentamente a luta que se desenrolava. As coisas eram só unhas e dentes, atacando com uma ferocidade inumana. Seus amigos se debatiam, resfolegando no próprio sangue ao terem as gargantas rasgadas. Uma ilha rubi se formara naquele bosque cinzento e de repente Michael se ouviu gritando. Olhou em sua direção no momento em que inciava uma fuga deseperada, correndo em direção a lugar algum. Duas das coisas dispararam atrás dele assim que outras quatro entraram no bosque. Passaram por ele sem vê-lo e dividiram-se entre o banquete e a caçada. Via claramente as coisas, que talvez uma dia tivessem sido humanas, se refestelando de seus amigos. Olhos, nariz, barriga. As partes moles foram sendo arrancadas, partidas, mastigadas, num frenesi de sangue digno dos mais depravados demônios. Sentiu seu estômago protestando e dobrou-se em si mesmo, vomitando de olhos fechados.
Passados os espasmos ele finalmente abriu os olhos e pôde ver que estava debruçado no asfalto grafite, sobre o corpo de um homem já grisalho. Algo rugia dentro de si e a fome tomava conta de seu ser. Nada o impediria de comer. Nada no mundo o faria abandonar aquele corpo. Olhou de lado e viu mais quatro dele aproximando-se do seu banquete. Rosnou em ameaça. O carro virado protegia seus olhos da claridade cortante do poste. Sua boca babava em antecipação ao que viria. Comida.
Mordeu o homem na altura dos olhos, arrancando-lhe o nariz. A carne era doce, suculenta. Num espasmo ele abriu os olhos e quase exprimiu um grito, mas foi abafado pelo som surdo de um baque na cabeça. O sangue lavou o asfalto e pedaços cinza-pulsante espalharam-se pela via. Outro dele abaixou-se e começou a comer avidamente. Mais um atacou as mãos e o restante mordeu-lhe o pescoço. Ele mal engolira o pedaço do nariz quando rasgou a camisa do homem num gesto e atacou a barriga com sua mão em faca, enterrando a mão nas entranhas ainda quentes do cadáver. Comeu até sentir-se saciado, procurando abrigo da luz feroz do dia num beco escuro. E lá adormeceu.
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Na escuridão, um ronronar baixinho invadiu o ambiente. Olhos pequenos, boca pequena, língua ávida. Sangue.
A pequena figura aninhada ergue a cabeça sinuosamente e lambe um ferimento extenso, que vai da cabeça ao pescoço de seu protetor. Agarra-se a ele como uma sangue-suga, extraindo o máximo possível da ferida. Logo apanha uma das mãos nas suas e vislumbra um corte profundo mas pequeno na lateral. A língua percorre toda extensão, desfazendo as barreiras naturais. O vermelho mancha novamente a manga da camisa. E ela suga, como um pequeno vampiro.
Num espasmo o corpo adormecido se põe de pé, arremessando a criança na parede oposta. O rosnar é perturbador enquanto ele se debruça sobre o pequeno corpo no chão. Numa mordida arranca parte da face da criança, que resiste se debatendo. Um soco poderoso afunda o crânio no piso da escada, espalhando o cinza rubro por todo ambiente.
Os sons espalham-se em eco escada acima, denunciando o banquete profano.
Ele come. Como nunca.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Crônicas Artonianas #38 - Conversas


O culto se revelou perigoso. Os cultistas eram fracos, porém o líder era um poderoso homem-serpente com muitas habilidades. Sir Lothar lutou bravamente e ficou cego. Kuala também. Mas no final, fora vencido. Teleportados, surgiram numa prisão, dentro de um jardim do senador corrupto. Lutaram, o derrotaram e fugiram. Descobriram que Yvaine, a nova medusa das trevas havia se tornado inimiga da Sétima Lâmina de Keenn. Tildror juntou as informações que tinha com Peleannor.

***

- Temo que o senador tenha sido enganado. Pela estatueta de Tenebra que encontramos em nossa aventura nos Charcos de Possun, o senador era mesmo um adepto dos ensinamento malignos da Mãe Sombria. Entretanto, ele fora enganado por sszzaasitas. - Ilendar falou friamente. Estava sentada numa cadeira de veludo bem adornada. O salão era gelado com paredes e piso de mármore. O estilo minotauro de construção já não causava admiração aos Desafiadores do Destino. Tildror estava sentado com portes aristocráticos. Kuala-Lampur, sir Lothar Orselen e Edward estavam há quilômetros dalí, escondidos em algum declive das planícies de Tapista aos arredores de Tiberius, a capital do império.
- São notícias tristes e pesadas para o nosso povo. Como aventureiros mostraram sua sabedoria em aceitar a discrição da missão e, por terem derrotado o senador e os cultistas de um deus morto, mostraram sua força perante os olhos de Tauron. Serão recompensados com medalhas imperiais e serão conhecidos como aliados militares. - Moreas sentava na maior cadeira, que mais parecia um trono. Seus modos eram refinados e calmos. Seu rosto bovino mostrava um misto de paciência, cordialidade e rigidez.
- Temo que Sszzaas não esteja morto, lorde Moreas. Eu e meu grupo aceitaremos de bom grado a recompensa. Existe outro problema, porém. Meu companheiro, Kuala-Lampur, precisa lutar em Vectoria em breve e, como a cidade voadora só passa por Marma, creio que jamais conseguiremos chegar a tempo. Gostaria de saber se é possível um transporte mágico até lá. Outra questão é que ele está cego e precisamos de um sacerdote que seja capaz de derramar-lhe bençãos mais poderosas que as minhas - Ilendar lembrava da revelação que recebeu enquanto orava por Azgher visando crescer sua fé em momentos escuros. Azgher lhe disse em pensamento que deveria fazer um ritual cerimonial em nome de Ahmed, um antigo paladino de Azgher. Lembrou-se que deveria pesquisar mais sobre ele futuramente, quando resolvesse os problemas urgentes. Lembrou-se de sua irmã, Yvaine e se sentiu culpada por tudo. Culpada pelo que sua irmã sofreu, por sua decadência e pelo consequente sequestro da irmã de Kuala-Lampur. O fato de deixá-lo nas planícies de Tapista cego e escondido como um criminoso a deixou um pouco com raiva.
Enquanto isso, Tildror observava a conversa de Ilendar e Moreas com ar respeitoso e atento. Puro engodo. Os anos na corte de Ahlen o ensinaram bem a dissimular atenção e seus gestos respeitosos eram automáticos. Sua mente estava longe. Pensava no que fazer quando se revelasse a verdade sobre a irmã de Kuala-Lampur. Era bem possível que ela estivesse morta agora, segundo o que soube com Peleannor. O elfo bitolado havia descoberto que a Sétima Lâmina de Keenn estava sendo enganada por uma sacerdotiza das trevas e que o ritual com Keilana-Peni era um engodo. Gente belicosa como eles eram, certamente iriam matar Keilana. Apenas um milagre a salvaria. E Kuala? O que ele faria com essa verdade? Tudo que menos precisava era um bárbaro louco de raiva jurando vingança. Assim as viagens e as batalhas nunca acabariam. Ele jamais teria paz porque teria que acompanhar o grupo, graças à sua ressurreição, graças ao clérigo de Thyatis... Graças à Savanna! Mulheres. Margareth! Lembrou-se em um susto de sua mulher grávida. Viu que chamou atenção de Ilendar e Moreas e sentiu-se estúpido.
- Hmm, e Margareth? Onde ela está?
- Sua humana foi conhecer Boren e as histórias fantásticas da Floresta de Naria. Voltará em dois ou três dias, segundo ela mesma. Não se preocupe, ela está com quatro soldados e uma de minhas esposas. - Moreas respondeu rapidamente, esperando voltar ao assunto com Ilendar.
- Certo, tudo bem. Sobre o transporte mágico, gostariamos que fosse urgente. - Tildror se sentia bastante aventureiro.
Moreas ergueu-se de sua cadeira e saiu da sala pedindo para que esperassem. Minutos depois, voltou.
- Amanhã de manhã. Enviei espiões que vivem no Gueto dos Elfos para raptar um mago. Aqui, escravos geralmente são proibidos de usar magia arcana, mas deixamos alguns elfos praticarem para que possamos usá-los quando houver necessidade. Assim eles ganham um privilégio ou outro em troca. Sobre a cegueira de seu companheiro, não se preocupem. Em Marma vocês poderão contactar o sacerdote de Tauron de lá, que é responsável pelos cultos. Mostrem as medalhas e ele lhes cobrará apenas o preço mínimo. - Moreas explicou como se fosse algo natural. Os elfos eram menos que animais no reino dos Minotauros e muitos aceitavam essa condição e chegavam a delatar outros elfos mais rebeldes.
O dia passou e Kuala, Edward e sir Lothar foram trazidos escondidos numa carroça para a mansão de Moreas. Uma vez lá, tomaram cuidado para que o cavaleiro da luz não ouvisse (pois também estava cego) a tortura ao elfo que, aparentemente, foi mais exigente que o esperado. Ilendar rangeu os dentes e pediu por paciência ao Deus-Sol e que os minotauros pagariam por seu modo de vida um dia. Tildror se esforçou para não esboçar um sorriso cínico. Kuala e Edward estava desatento e não viu nada.
A mágica foi pronunciada por um elfo em lágrimas e com hematomas pelo corpo. O grupo sentiu seu chão sumir e a realidade à sua volta transmutar. Logo estavam nos arredores de uma cidade de médio porte, com carroças, mercadores, minotauros pomposos, minotauros guerreiros, alguns poucos aventureiros, a plebe humana e as centenas de escravos. Muitos magos eram escravos particulares dos minotauros mais ricos. Muitos magos viviam em suas pequenas lojas de poções e pergaminhos e forneciam transporte mágico para Vectora. Acima, uma enorme montanha de ponta cabeça sob as nuvens. Era uma visão magnífica que atordoou um pouco os Desafiadores do Destino. Então, após um pouco menos de duas horas procurando pelos conhecidos, os Desafiadores do Destino chegaram até Ikarus, o "dono" de Kuala-Lampur. Ele sorriu por ver Kuala vivo e espumou de raiva ao saber que estava cego. Foram para o templo de Tauron onde marcaram uma audiência. O sacerdote os atendeu pela noite e Kuala-Lampur e sir Lothar voltaram a enxergar o mundo, os velhos rostos conhecidos e os desconhecidos. Descansaram na estalagem em que Ikarus estava hospedado e amanheceram para o dia decisivo em Vectora.

Farid, o único


Ele sempre fora um bom amo para Amani. Ela é uma gênia verdadeira e, portanto uma prisioneira dele. Nunca lhe faltara nada, não que ela precisasse de nada, afinal ela tinha o dom de Wynna, a deusa da magia; era capaz de conjurar o que precisasse para satisfazer suas necessidades.

Os desejos dele eram sempre atendidos apesar de na maioria das vezes não serem possíveis através de magia. Ele queria mulheres, possuía um harém delas em sua mansão. Amani por vezes se deitou com seu amo para satisfazê-lo. Numa dessas vezes, ela engravidou.

O cruzamento entre humanos e gênios na maioria das vezes gera descendentes mágicos. E foi o caso de Amani. Ela teve um filho meio-gênio que chamou de Farid, “único” na língua do povo do deserto Sar-Allan.

Farid sempre fora muito amado por sua mãe, que para poupá-lo de sua prisão o tratou sempre como se fosse adotado para que seu pai não soubesse que ele era filho legítimo dos dois e na verdade seu filho. Ela acredita que caso ele descubra ele irá requerer a propriedade dele como tem a dela. Um contrato mágico entre um gênio e seu amo.
Cresceu em sua mansão fazendo pequenos serviços sem nunca revelar que era seu filho como tinha prometido a ela assim que soube a verdadeira história de seu pai. Por sua natureza mágica, compreendia bem como funcionava esse tipo de contrato mágico. Farid preza muito por sua liberdade e evita falar sobre seu pai que é muito influente entre pessoas do reinado.
Farid adora ajudar os amigos e não se nega a fazer isso através de seus pequenos desejos. Ele também é um apaixonado por itens mágicos e jóias. Não perdendo a oportunidade de ir atrás de um dos dois. Seu aprendizado na magia também é muito valorizado por ele.

Por esse motivo viajou até o reino de Fortuna atrás de um item mencionado por seu pai. Queria conhecer mais sobre objetos mágicos e ampliar seus conhecimentos sobre o dom de Wynna, a magia.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

Aurora Carmesim #1 - Travessia

A atmosfera recendia a ferrugem.
A seus pés descortinava-se uma planície salpicada de corvos, e forrada de corpos. Impassível no alto de seu orgulho, Keen ainda sentia os efeitos daquela última batalha. Na verdade fora um massacre. Três mil almas incautas lançadas contra seu exército. Na verdade nem tão incautas assim – eram a elite do general –, porém, Mardoc já fora um desafio melhor.

Algo naquela atitude o incomodava. Por que desperdiçar três mil homens de elite num momento feito aquele, quando a maioria estava poupando recursos e puxando suas teias de aliados? Mardoc poderia facilmente reunir dez vezes essa quantidade de homens caso realmente precisasse. Poderia invadir o recém-criado reino da tormenta e varrer aquelas abominações caso fosse vantajoso. Mas atacar assim? Não era lógico. Não. Era um engodo. Mas por quê? Para que?

- Será que...? Não. Definitivamente não. Aquele maldito não ousaria. – Keen desfiava pensamentos em voz alta. Conforme sua fúria aumentava, Werra tremia em espasmos. A violência explodia.

- Tragam Ostherwulf. Agora! – E uma montanha no horizonte explodiu em lava furiosa.
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Era o local indicado.
Uma caverna no canto mais longínquo de Werra, onde as fronteiras quase tocavam o reino de Ragnar. Caverna das Almas.

Deveria se encontrar com sacerdote que o prepararia para a passagem. Finalmente voltaria à caça. Chega de joguinhos de guerra. Chega de batalhas por batalhas, onde o objetivo principal era apenas a carnificina em si. Não que ele tivesse abdicado do prazer da violência. Gratuita. Furiosa. Excessiva. Mas acreditava que não conseguiria passar o resto da eternidade assim. Esses últimos 800 anos foram até proveitosos no início, com festins de violência e sangue para comemorar cada feito, a passagem de cada década, a morte de cada adversário valoroso. Porém logo sentira falta da caçada, do terror nos olhos da presa, do surto de adrenalina. Ganhou salvo-conduto de Keen para agir por conta própria. Conquistou a “Marca da Discórdia”, dada pelo próprio Keen, para impedir que o deus perscrutasse os planos dos adversários que ele considerava dignos. Estava além do clima reinante em Werra nos últimos 200 anos.

Mas ele retornara. Mortal. Em carne e osso. Em Arton.
Desde a última vez em que esteve no plano material Mardoc ansiava o encontro, o último teste de força, a ruína derradeira dos lagartos. A Presa Máxima.
Kallyadranoch.

A boca escancarada da caverna se tornara visível ao lado de uma corredeira furiosa. Sua garganta profana expelia uma luminosidade rubra, cor de sangue, em todo o chão à frente da entrada. Pontilhando as montanhas ao redor, construções sombrias denunciavam a existência de coisas vivendo ali. Toda a caverna parecia meio arruinada, decadente. A energia da morte era forte aqui.

Parado, fitando a entrada da caverna, existia uma figura metida em trajes estranhos. Sua sombra, projetada pela luz da caverna, espalhava-se pelo chão como uma poça de sangue fresco. Algo brilhava em suas mãos, dispostas à frente do corpo, onde Mardoc não podia enxergar diretamente.

- Olá caçador. Alegro-me em ver-te aqui. – disse a figura se virando. Olhos mortos, face pálida, fronte serena. Não era nativo, não era vivo, não estava morto. Era algo diferente, alguma coisa que eriçava os pelos, apertava o estômago, molhava a face.

- Olá sacerdote. Espero que seja capaz do que dizem por que se não for, vou arrancar seu fígado com minhas próprias mãos e fazê-lo comer, antes de escalpelá-lo com minha faca enquanto ainda vive. Não sobrará nada de você que seja digno de chamar de restos.

- Acredito que divertir-se-ia bastante de fato doravante isso não faz parte dos meus planos no momento. Acompanhe-me caçador, entremos na caverna para que os ritos comecem. Tens tudo que precisa contigo?

Olhando para si Mardoc lembra-se do que deixou para trás e não fora capaz de buscar. Malditos lagartos. Sua hora chegaria em breve.

- Sim sacerdote. Tenho tudo que preciso aqui e o que me falta eu pego quando atravessar.

- Que seja. Entremo-nos, pois a hora se aproxima.
E caminharam lado a lado em direção ao interior da caverna. Sombra a sombra, espalhando sangue fresco no chão.

quarta-feira, 8 de julho de 2009

Extinção #1 - Gritos Áfonos

Café Strauss, Downtown

Dominik acordara de sobressalto.
Sentara sob o balcão da cafeteria a qual encontrara abrigo. A seus pés, dormia uma figura cansada de aparência doente, serena como uma criança, excetuando-se o chiado constante que fazia ao respirar. Encostou a cabeça na parede fria e começou a digerir as útlimas horas. Havia perdido quase tudo que considerava valioso em sua vida. Sua mulher, sua filha, sua casa, emprego, tudo se foi, rodopiando nas cinzas dos acontecimentos. Sem dar-se conta, lágrimas começaram a rolar, face abaixo. Como isso foi acontecer?

Os minutos alongaram-se indefinidamente enquanto Dominik pensava sobre a ruína do seu mundo. O homem ao seu lado tossiu, uma tosse ruidosa, pesada, doente e ele foi arrancado de seus devaneios. Já era hora de traçar um plano, um meio de sobreviver até a chegada à fronteira. Inconscientemente, Dominik olhara em direção ao embrulho que era sua filha. Fizera um casulo improvisado com as toalhas de mesa limpas que encontrara no armário de frente ao balcão, isso serviria pra aquecê-la até a chegada da manhã.

Quase em câmera lenta, notara todo o pequeno ambiente que jazia ao seu lado. As toalhas afastadas, murchas, um dos pés do sapato perdido em meio às dobras das toalhas, o frio da ausência partindo o pouco da calma que conseguiu erigir. Seu coração martelou em resposta, mesmo que o cérebro demorasse um átimo de segundo para entender. Num surto adrenal ele pôs-se de pé. Olhos arregalados varrendo o ambiente lúgrube. Uma luz pálida, ocre, pálida, inundava todo o ambiente cobrindo tudo com uma mortalha difusa. A porta pesada de vidro fechada e escorada como deixara, não haviam janelas e nem outras entradas. A não ser pela cozinha, onde a pálida luz do ambiente não alcançava. Onde as portas duplas retornáveis encerravam o desconhecido.

Apurou os ouvidos em busca de sons de sua filha: cantorias, murmúrios, passinhos, qualquer coisa. Apenas o crepitar longínquo do centro em chamas dominava o espaço. Adiantou-se por sobre o desconhecido(?) a seus pés e abriu relutante as portas duplas. O metal onipresente na cozinha faiscou, dando à Dominik a impressão de retornar à velha câmara de experimentos avançados. Olhou pra noite encarcerada do lado de fora das vitrines de vidro grosso e mergulhou na escuridão da cozinha com as portas suspirando ao se fecharem.

* * *

Piscou algumas vezes até seus olhos se acotumarem à escuridão imperativa do ambiente. Por sob a porta duas finas lâminas de luz torpe derramavam luz sobre o piso quadriculado. Um balcão extenso, um catre recoberto de panelas diversas, um faqueiro com mais facas do que poderiam ser úteis sobre a pia à esquerda. Armários dominavam o ambiente, por sob e sobre quase tudo e um avental farfalhando suavemente denunciava que o chefe se fora. Caminhou pé ante pé para circundar a bancada, ouvindo seu coração pulsar nos tímpanos. Respirava rapidamente, o cenho endurecido de sangue coagulado e seco movia-se talhando padrões estranhos em sua face. Onde estava ela?

Encontrou o chão com baque surdo, seus joelhos não suportaram a endorfina do alívio. A pequena Anna estava sentada atrás do balcão, protegida à sua sombra, roendo uma bisnaga de pão doce um pouco grande demais para seu tamanho. Agarrou-a nos braços, apertou-a, cobriu-a de beijos. Estava viva. Estava bem.


RRRRRRRRRRrrrrrrrrrrrrrrrrrrraaaaaaaaa...

Dominik sentiu o sangue sumir do corpo. Virou o rosto devagar encotrando o pesadelo às suas costas. Uma porta entreaberta no fundo da cozinha revelava a silhueta de alguma coisa situada entre o bizarro e o profano. Uma mulher trajada de noiva quase em sua totalidade fitava os dois com seus olhos mortos. Os dentes arreganhados e as marcas de sangue do vestido denunciavam que aquela mulher descabelada a muito não era humana. Não estava consciente.
Como pudera não ver a porta no fim da cozinha? Como fora tão descuidado de si mesmo e da pequena Anna?

Levantou-se devagar, antevendo o pior. Se gritasse por ajuda a coisa viria diretamente a seu encontro. Se corresse ela o seguiria e talvez matasse a todos. Tinha a pequena Anna em seus calcanhares, agarrada às suas coxas, nunca iria conseguir circundar o balcão a tempo. Deslizou a mão sobre a superfície gélida à procura de algo. O metal acariciava seus dedos com um beijo fúnebre, liso e perfeito como a pele de um infante, recusando-se a agraciá-lo com algo útil.
Estendeu a mão livre à frente num gesto débil de não-agressão e a criatura deu mais um passo em sua direção, intoxicando a esterelidade do ambiente com seus pés imundos e sua baba fétida que escorria durante os austos furiosos. Agitava freneticamente o braço sobre a pia, rezando para que a sorte lhe sorrisse. A criatura deu mais um passo. Seus olhos ficaram nítidos como a idéia em sua cabeça. Existir. Sobreviver. Defender.
E deu um passo à frente.

* * *

Sentia sua boca ferruginosa, pegajosa, salgada. Com o canto do olho aberto fitava a silhueta atravessar a porta e ganhar a noite. Em seu abraço macabro a pequena Anna debatia-se freneticamente, rasgando a escuridão com seus gritos. Ele chorava debilmente, o líquido salino misturando-se à poça de sangue que tingia o piso. Sua mente fraquejava. Seu corpo rendia-se. A alma gritava e a boca recusava-se a emitir um som se quer.
Se foi e com ela o que restava de seu mundo.
Fechou os olhos, entregando-se.
- Dominik? Dr. Dvořák?

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Vanthuir Skullbringer - Flagelo das Uivantes

Frio.
Desolador, interminável, mortal.

Talvez fosse a primeira sensação que ele registrara em vida. Desde cedo aprendera a sobreviver nas montanhas geladas. Nascera num parto improvisado, em meio à uma das freqüentes viagens da tribo em busca de paragens menos desoladoras. Seu pai, Vegvisir, recebera seu nome graças às previsões da matriarca. É o mesmo nome do compasso rúnico marcado em seu peito antes da "primeira passagem". Uma marca de sorte e poder, e graças a isso - e também por isso - ganhou seu sobrenome de adulto. Whitefox. Esperto, capaz de sobreviver em qualquer ambiente e achar qualquer caminho. E era isso que fazia no dia em que Vanthuir nascera, conduzia a tribo.

E talvez por essa razão - a viagem - Vanthuir tenha recebido esse nome. Significa peregrino. Mesmo a matriarca não se opusera à escolha. Suas previsões revelavam que a criança trilharia muitos caminhos, veria muitas paisagens, seria um verso constante nas canções de viagens e descobertas.

A própria havia realizado o parto, numa iurta débil, no alto das montanhas, em meio a uma tempestade constante e à escassez de recursos. Fora um ano difícil. E por isso também sua mãe não resistira. Gibu-Auja não era bela mas decerto fora abençoada. Dera cinco filhos à seu marido, todos homens, todos saudáveis. Vanthuir fora o último da linhagem e viera quando sua mãe já havia resistido a trinta invernos. Velha demais, cansada demais, fraca demais. Seus últimos dias foram passados ao lado do rebento mais novo, no que restara da viagem. Assim que estavam outra vez instalados, ela fez a passagem. A "última passagem".
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Frio.
Branco, estéril, opressor.

Vanthuir já sobrevivera a onze invernos. E adorara. Pelo menos havia adorado até a chegada do seu décimo segundo inverno. Era chegada a hora de fazer a "primeira passagem". Sobreviver sozinho durante seis escudos e retornar à tribo trazendo histórias, experiência, conhecimento e um presente ao líder. Ele daria seu nome de adulto, recebido com respeito por todos e honrado por seu possuidor.

Whitefox. Whitepaw, Sharpclaws. Strongteeths, Ragewolf. Sua família possía nomes fortes, poderosos. Seu pai trouxera o caminho. O primogênito, um manto de pele de urso branco. O segundo, um colar de garras, algumas com mais de quinze centímetros de comprimento. O terceiro, armadilhas. O quarto, trouxera um filhote de lobo atroz, companheiro do líder até hoje.

Como suplantar esses feitos? Como equiparar-se e honrar seu sangue abençoado?
Partira com essas e outras perguntas na cabeça, rumo ao exílio auto-imposto.
Seis escudos para provar seu valor.
Seis escudos e seria homem.
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Frio.
Acolhedor, carinhoso, constante.

O caminho para casa consumira suas últimas duas luas. Sentiu o cheiro da tribo antes mesmo de avistá-la encrustada em um platô, na base das montanhas. Era o fim da primavera e a vida fervilhava no acampamento. O Grande Lobo tinha sido generoso e as crianças enchiam o ar com suas vozes estridentes. Vanthuir caminhava com um sorriso genuíno no rosto e lembranças doces na cabeça. Corria num ritmo constante os últimos quilômetros que o separavam de casa. Do lar.
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Frio.
Desafiador, brutal, furioso.

- Meu presente para Hræthigaldur, meu líder. - Falou Vanthuir com voz firme, decidida.
Seu rosto, seu crânio, seu corpo, sua alma ainda traziam as marcas da passagem. Três grandes cicatrizes sobre o lado esquerdo da face. Um olho cego. Parte do escalpo faltando.
Ele estendia à Hræthigaldur um grande pacote coberto por peles.

- E eu aceito de bom grado Vanthuir, filho de Vegvisir. - Disse Hræthigaldur, recebendo o pacote com a pompa que era devida ao momento.

Hræthigaldur nascera pra liderar. A matriarca predissera seus feitos muito antes dele vir de fato ao mundo. Significa medo aos inimigos. A tribo florescera sob sua mão e aprendera a amá-lo como a um pai. Era terrível em combate e sábio em suas decisões. Amável como uma avó e esperto feito um furão. Um homem fantástico.

Toda a tribo acompanhava a cerimônia e a ansiedade era palpável. Qual seria o presente? Toda sua família sempre surpreendera a todos. Seria o jovem guerreiro capaz do mesmo? Suas marcas denunciavam uma viagem difícil. O que teria trazido?

- Eu matei o futuro. O futuro de nossos inimigos. Levarão muitas luas para chorar suas perdas e várias estações para semear novamente suas mulheres. Envenei seus ventres. Nossos filhos crescerão em paz, por toda minha geração. - Não havia dúvidas em sua voz ou remorso em seus olhos. Estava impassível, enorme, impiedoso. Não existia nele sequer uma pálida sombra de quem partira.

Ao abrir o pacote, Hræthigaldur contemplou seu interior. Diversos crânios - pôde contar vinte e sete -, de tamanho e forma variados, espiavam-no com olhos mortos. Um odre de couro estava fechado no centro. Parecia um órgão de algum animal feito de odre, curtido e preparado.

- Aceito seu presente jovem Vanthuir. - E o aglomerado em torno explodira em júbilo.

- Meu coração sente orgulho e minha mente vaga pelo futuro. Você honra a casa de seu pai e o sangue que corre em suas veias. A tribo tem honra por tê-lo gerado. De hoje em diante que todos cantem também o seu nome, quando recitarem a história da tribo. Você resistiu, sofreu, feriu e venceu. Seu crânio traz as marcas da batalha, seu rosto, a história de teus feitos. E você retornou. Me trouxe as cabeças, as faces do futuro. Skullbringer. Seu nome trará medo à alma dos inimigos e orgulho ao coração da tribo. Levante-se e vá, Vanthuir Skullbringer.

E ele se levantou, ouvindo de longe as saudações e comemorações da tribo. Fitava o rosto de seu pai e irmãos, no fim do caminho. Podia sentir sua aprovação, tatear seu orgulho. Era um homem e tinha respeito.

A viagem apenas começava.

sexta-feira, 3 de julho de 2009

Crônicas Artonianas #37 - Fim de Mistérios


- Vida longa à Destruktor!
Com um urro de batalha, Eric Hobsbawm ergueu sua espada com ambas as mãos como um punhal, prestes a furar o peito da pequena khubariana, Keilana-Peni. As luzes dançavam ao sabor das chamas que iluminavam a câmara secreta da Torre de Covariel, em Lomatubar. O suor de uma angústia ansiosa brotava no rosto de Thomas Kanar que observava a cerimônia de sacrifício que traria o glorioso sumo-sacerdote de Keenn de volta.

***

Antes.
Azgher iluminava Arton brandamente, lembrando a todos que o outono estava próximo. Peleannor levantou-se lentamente de sua cama improvisada no meio da floresta, em Petrynia. Seu grifo estava caçando o que comer. Sorriu ao imaginar as conseqüências de seus atos. Temia que fosse tarde demais, é verdade, mas também saberia que a Sétima Lâmina de Keenn não sairia impune acontecesse o que for. Abriu seu grimório, displicente.

***

Depois.
A medusa das trevas rangia os dentes em cólera. Amaldiçoava aos quatro ventos o nome de Ilendar. Seus planos foram frustrados, indiretamente, por sua amaldiçoada irmã. Mas nem tudo estava perdido. Havia o Cajado de Osso do Dragão Vermelho que estava no momento perdido. Ela investiria nisso, o mais rápido possível, antes que os Desafiadores do Destino conseguissem escapar de Tapista. Por hora, deixou de lado seu antigo aliado que constava desaparecido. Temia seus novos inimigos, apesar do desaparecimento de seu líder. Possuía outras pesquisas em andamento, possuía vários rumos a seguir. Deixou o Cajado como missão de seus aliados menores. Concentrou-se no norte...

***

Durante.
- Espere!
Iqmar Strongfeet e Valahad de Bedivere arrombaram a porta feita de pedra com suas poderosas armas. O pequeno halfling tomou a frente, impedido a morte da khubariana. Eric os observava com os olhos estreitos.
- Meu senhor Primeira Lâmina - prostrou-se - tenho um relatório importante e vital.
- Espero que seja vital, Quarta Lâmina. - A voz de Eric era ameaçadora e seus cabelos grisalhos apenas causavam um aspecto de maturidade veroz.
- Estamos sendo enganados desde o início. Yvaine é uma traidora. O ritual que está prestes a concluir não trará nosso glorioso sumo-sacerdote de volta. Irá libertar o demônio Krovangar, aliado da serva de Tenebra. Ele vem do mundo da morte de Ragnar e pretente expalhar a Praga Coral pelo mundo. Não mate a khubariana!
Eric franziu o cenho. Olhou Thomas Kanar surpreso. Observou Valahad de Bedivere parado como uma estátua. Cerrou o punho e largou sua espada no chão. Socou com violência uma parede causando um grande buraco. Planejou um ato de vingança.
Porém, a torre começou a tremer. O chão começou a rachar. Um grito de ódio profundo vindo das profundezas ecoou pela torre.
- Tolos! Não deveriam ter parado! Agora sintam minha ira!
Então, um círculo feito de energia negra surgiu no chão e dele, uma poderosa criatura surgiu. Uma grande entidade do inferno parecia uma linda mulher com seis braços - pelo menos da cabeça até a cintura. Dali por diante, a criatura tinha um corpo de uma enorme serpente com escamas esverdiadas. Seu rosto feminino denunciava traços que lembravam um bugbear. Brandido seis espadas longas, ela avançou com fúria sobre as Lâminas de Keenn. Uma batalha horrenda se sucedeu e Iqmar Strongfeet morreu. O Cajado de Osso do Dragão Vermelho se perdeu jogado pelo canto. Eric Hobsbawm, Thomas Kanar e Valahad de Bedivere lutavam bravamente e começaram a acuar a criatura vinda do plano da morte.
Foi quando uma luz branca e brilhante surgiu ao lado da batalha. Sua forma tomou contornos humanóides, de um homem com mantos brancos. Seu rosto era fantasmagórico e ele gritava ser
Thursten Covariel, o antigo mago real de Lomatubar, o responsável por trazer a Praga Coral ao mundo. Os combatentes ficaram por alguns segundos paralizados e, antes que pudessem reagir, o mago convocou uma explosão. Uma explosão de doença. Todos foram maculados e desapareceram dalí.
Dias depois, Thomas Kanar e Valahad se encontraram pela floresta. Estavam feridos e doentes. O Cajado de Osso do Dragão Vermelho estava desaparecido. Eric Hobsbawm também sumira, assim como o demônio Krovangar. Dúvidas e falta de um norte. A Sétima Lâmina de Keenn estava esfacelada por hora...